sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Análise da cena "O FRADE"




O FRADE (FREI BABRIEL) E A MOÇA (FLORENÇA)  
O FRADE (FREI BABRIEL)
E A MOÇA (FLORENÇA)

Trata-se de um frade cortesão, dançarino, cantor e esgrimista que surge, no estrado, com a sua amante pela mão. O Diabo sentencia que ele irá para o Inferno por viver amancebado, desprezando assim os votos de castidade que formulara. Toda a defesa do Frade consiste em acreditar que o hábito que enverga o livrará das chamas infernais. Mas, repelido pelo Anjo, resigna-se e entra, juntamente com a sua amásia, na barca da  perdição. 
Mário Fiúza, in op. cit.
O CLERO NA ÉPOCA VICENTINA

O clero, classe numerosa, estava presente em todos os sectores da sociedade portuguesa, desde a corte até às mais escondidas aldeias das províncias. A maior parte dos seus membros acusava uma singular relaxação de costumes. Acontecia que muitos deles seguiam a carreira eclesiástica sem vocação, pela necessidade ou ela vontade dos pais. Era um meio de se livrarem das obrigações militares e de terem a vida assegurada, pois os conventos possuíam os seus bens materiais próprios. Daí a desconformidade entre os ideais e os actos, pois em vez de viverem uma vida de pobreza, de humildade de oração, buscam antes a riqueza e os prazeres da vida, são espadachins, blasfemam, têm mulher e filhos, ambicionam honras e cargos, bebem e até... se dedicam à astrologia. Muitos abandonam a clausura para viverem na corte, deixam crescer a tonsura; outros suspiram continuamente por bispados.
in Gigantes da Literatura Universal, Ed. Verbo
O tipo mais insistentemente observado e satirizado por Gil Vicente é sem dúvida o clérigo, e especialmenle o frade, presente em todos os sectores da sociedade portuguesa, na corte e no povo, na cidade e na aldeia. Gil Vicente censura nele a desconformidade entre os actos e os ideais, pois, em lugar de praticar a austeridade, a pobreza e a renúncia ao mundo, busca a riqueza e os prazeres, é espadachim, blasfema, tem mulher e prole, ambiciona honras e cargos, procedendo como se a ordenação sacerdotal o imunizasse contra os castigos que Deus tem reservados para os pecadores. A principal ambição dos clérigos vicentinos é bispar, ou seja, tornarem-se bispos ou prelados. Para o conseguir, um frade que participa na Romagem de Agravados defuma-se com palha amarela de modo a aparentar um rosto macilento de jejuns e mortificações. A sátira vicentina anticlerical, que atinge uma extraordinária violência, tem, além do seu fundo popular e tradicional, intenções bem definidas e às vezes alvos directos. Segundo Gil Vicente, os frades são indesejavelmente numerosos: “Somos mais frades que a terra”. Na Frágua do Amor, que simboliza a regeneração de Portugal a propósito do casamento do rei, um frade sem vocação entra na frágua e sai transformado em soldado; e mais sete mil frades aguardam o mesmo tratamento. Na Exortação da Guerra, Gil Vicente faz-se intérprete da pretensão do rei a cobrar o terço dos rendimentos dos bens eclesiásticos para a “guerra santa” em África. Desta forma se critica a multiplicação excessiva do clero e dos rendimentos eclesiásticos, que os monarcas queriam então desamortizar e adjudicar à coroa e à alta nobreza.
A. J. Saraiva e Óscar Lopes, in op. cit.
(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

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