domingo, 5 de dezembro de 2010

OLIMPÍADAS DE ORTOGRAFIA

Olimpíadas de Ortografia - 2010/11
Regulamento

1.    OBJECTIVOS:
v Experimentar percursos pedagógicos que proporcionem o aperfeiçoar da escrita;
v Aprofundar a prática de escrita;
v Fomentar os hábitos de escrita nos jovens.

2.    MODALIDADE:
v Exercício de escrita de um texto seleccionado de acordo com o ano de escolaridade(5º, 6º, 7º, 8º e 9º anos).

3.    PARTICIPAÇÃO DOS CONCORRENTES:
v 1ª Fase de selecção – Todos os alunos de escola (2º e 3º ciclos);
v 2ª Fase de selecção – Alunos seleccionados na 1ª fase;
v 3ª Fase de selecção – Alunos seleccionados na 2ª fase.

4.    OPERACIONALIZAÇÃO:
v Um exercício de escrita por período:
- 1º Período: durante o mês de Novembro;
- 2º Período: durante o mês de Março;
- 3º Período: prazo a estipular;
v 1ª e 2ª fases - realizadas dentro da sala de aula pelos professores de Língua Portuguesa que leccionam cada uma das turmas;
v 3ª fase – Os alunos seleccionados por ano de escolaridade distribuir-se-ão por salas de acordo com um calendário oportunamente divulgado;
v A correcção dos exercícios de escrita de cada turma será da responsabilidade do respectivo professor de Língua Portuguesa.
4.1. Critérios de selecção:
v 1ª Fase - serão seleccionados todos os alunos que tiverem até 6 erros (inclusive);
v 2ª Fase – só participarão nesta fase os alunos que tiverem sido seleccionados na 1ª fase e passarão à fase seguinte todos os que tiverem até 5 erros inclusive;
v 3ª Fase – será(ão) vencedor(es) o(s) aluno(s) que tiver(em) o menor número de erros ortográficos.
4.2. Critérios de correcção:
v Será considerado erro ortográfico:
- palavra incorrectamente escrita;
- ausência de acento / sinal auxiliar de escrita;
v A correcção dos exercícios de escrita de cada turma será da responsabilidade do respectivo professor de Língua Portuguesa.
4.3. Prémios:
v O(s) concorrente(s) vencedor(es) receberá(ão) um diploma e um prémio a definir.

Concurso Nacional de Leitura - Alunos Concorrentes

No dia dezoito do mês  de Novembro terminou o prazo de inscrição para o Concurso Nacional de Leitura a nível de escola e os alunos concorrentes já podem requisitar os livros selecionados. Para tal, basta dirigirem-se à Biblioteca Escolar e preencherem a respectiva Ficha de Requisição. Podem ainda, se considerarem necessário, renovar a requisição dos livros por mais tempo e até durante as férias de Natal.
A lista dos alunos inscritos também se encontra no placard da BE/CRE.
Continuação de boas leituras!
CNL_ ALUNOS INSCRITOS_2010-11

domingo, 21 de novembro de 2010

VAMOS AO TEATRO

Visita de estudo ao teatro no Mosteiro dos Jerónimos

 (Agora já é possível  fazer a visita virtual ao monumento, para tal utilize as setas para ver tudo em 360 graus, os sinais + ou – para ampliar ou reduzir detalhes, e estender a visita a outras salas ou locais carregando nos alvos (em vermelho)).


Cartaz do Teatro
no Mosteiro dos Jerónimos 
O Auto da Barca do Inferno de Gil Vicente destina-se sobretudo aos alunos do 9º ano de escolaridade e desenvolve-se, de forma interactiva, no piso superior do Claustro do Mosteiro dos Jerónimos.

Todos os pretextos são bons par ir ao teatro, mas,  na sequência do estudo de um texto dramático, é quase imprescindível assistir a uma representação, num palco a sério, com actores de "voz e osso".

Vamos ter a oportunidade de preparar a ida ao teatro e conhecer pormenores sobre o trabalho complexo que é passar do texto à peça - pensa nos cenários, no guarda-roupa, no som, nas luzes, nas movimentações dos actores, entre outros... 
 
Para conhecer melhor a peça e a companhia de teatro
Ar de Filmes
  http://ardefilmes.no.sapo.pt/barca.html 
A Alcoviteira, Brísida Vaz

sábado, 20 de novembro de 2010

VAMOS AO CINEMA - O filme "A vida é Bela"

Capa do DVD  do filme
"A Vida é Bela"
Sinopse:
Na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial, Guido, filho de judeus, é mandado para um campo de concentração, juntamente com seu filho, o pequeno Giusoé. Guido é um homem simples, inteligente e espirituoso, um pai amoroso, e graças a isso consegue fazer com que seu filho acredite que ambos estão a participar num num jogo, sem que o menino perceba o horror no qual estão inseridos.
Uma fábula tragi-cómica, o filme mais popular de Roberto Benigni, vencedor, entre muitos outros prémios internacionais, do Óscar para o melhor filme estrangeiro e melhor actor para Benigni. É uma deliciosa de fábula, e um hino à vida dos duros tempos da Europa da Segunda Guerra Mundial, onde o nosso protagonista Guido, um homem inocente, terá que utilizar a sua imaginação e força de vontade para salvar as vidas daqueles que ama.

Trailer do filme "A Vida é Bela", de Roberto Benigni

Análise da cena "OS QUATRO CAVALEIROS"



Os Quatro Cavaleiros
OS QUATRO CAVALEIROS
Gil Vicente termina com uma cena apoteótica que constitui a moralidade do auto. Opõe os cavaleiros que morreram a combater pela Fé aos que trabalhavam pola vida transitória[v. 830].
O facto de terem morrido a combater os Mouros é o suficiente para alcançarem o Paraíso: morremos nas Partes d’Além / e não queirais saber mais[vv. 849-850], responde o segundo cavaleiro ao Diabo quando este ousa interrogá-los. E o Anjo, ao declinar da cena, diz claramente: “...quem morre em talpeleja / merece paz eternal[vv. 861-862].
Mestre Gil santifica a guerra que então travávamos no Norte de África, como já havia feito, quatro anos antes, na Exortação da Guerra.
Mário Fiúza, in op. cit.
 (extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O ENFORCADO"


O ENFORCADO
Na derradeira parte do auto, aparece-nos um ladrão a quem a Justiça condenou à forca, ainda com o baraço em volta do pescoço, que vem convencido de que irá para o Céu. Quem o persuadiu? Gil Vicente afirma-nos que foi intrujado por Garcia Moniz, Mestre da Balança da Moeda de Lisboa,e, muito provavelmente, superior do poeta de 1513 a 1517. Este teria convencido o ladrão enforcado de que iria para o Paraíso, visto ter-se já purificado dos pec ados cometidos no purgatório do Limoeiro e que poder-se-ia considerar um “santo canonizado” por muito ter sofrido durante toda a sua vida.
Contudo, o Enforcado, desiludido pelo Diabo, reconhece finalmente que não tem perdão possível e, tal como já fizera o Judeu, nem sequer vai pedir ao Anjo que o acolha.
É nítida a intenção, da parte de Gil Vicente, de satirizar mais a doutrina do que o próprio ladrão enforcado. Enquanto não se apurarem mais dados biográficos sobre o Mestre da Balança da Moeda de Lisboa, esta cena permanecerá para nós um tanto ou quanto enigmática. O público do tempo, conhecedor de factos que desconhecemos, viu-a com olhos muito diferentes dos nossos.
Mário Fiúza, in op. cit.
 (extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O CORREGEDOR E O PROCURADOR"



O Corregedor
O CORREGEDOR E O PROCURADOR
[Esta cena] forma um amplo quadro da Justiça humana, que Gil Vicente opõe à Justiça divina.
O Corregedor aparece-nos carregado de processos (feitos) e com uma vara na mão. Pouco depois, junta-se-lhe o Procurador, que vem abarrotado de livros. Ambos dialogam com o Diabo em latim jurídico deturpado, que tem função cómica e também caracterizadora.
A principal e quase única acusação que o Diabo lança ao Corregedor é a de não ter sido imparcial nas suas sentenças, deixando-se corromper por dádivas recebidas até de judeus. Parece que uma das prendas mais generalizadas era a perdiz, o que originou a célebre exclamação do Diabo: Oh amador de perdiz...” [v. 607].
O Corregedor não nega esta acusação e limita-se a atirar as culpas para cima da mulher. Era ela quem recebia as prendas e, por isso, ele sentia-se isento desse pecado.

Tal como na cena V [vv. 308-319], também Gil Vicente foca a confissão das almas pouco antes de falecerem. O problema é resolvido aqui deste modo: o Corregedor confessou-se mas ocultou todos os seus roubos, enquanto o Procurador nem sequer se confessou porque não se apercebeu que havia chegado a sua hora derradeira. Interessantes ainda dois pormenores a que vamos dar o devido relevo: o neologismo descorregedor, com forte carácter satírico, e o diálogo final entre o Corregedor e a Alcoviteira. O juiz do tribunal terreno torna-se réu no tribunal divino.
O Procurador


Merece ainda referência a pergunta formulada pelo Corregedor, inquirindo do Diabo se não existia lá meirinho do mar. Trata-se de um hábito adquirido no desempenho da profissão que o tipo não abandona mesmo depois da morte. Mais uma vez o Parvo se confunde com o Diabo quando insulta e injuria o Corregedor e o Procurador.
Observamos finalmente que, não obstante Gil Vicente ter dedicado ao Corregedor e ao Procurador igual número de versos, este aparece-nos com muito menos realce do que o seu companheiro.
Mário Fiúza, in op. cit.

(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O JUDEU"


O Judeu
O JUDEU (SEMAH FARÁ?)
Gil Vicente giza o tipo do judeu, exagerando sobretudo dois traços: o apego à sua religião, simbolizado no bode expiatório que ele não quer largar, e o seu proverbial amor ao dinheiro, expresso nas moedas com que tenta subornar o barqueiro. O transporte do bode redunda em cena cómica quando o Diabo se recusa a conduzi-lo na barca e, mais tarde, resolve levar ambos a reboque.
Este pormenor de o Diabo não ter permitido a entrada do Judeu na sua barca é muito significativo: marginaliza de tal modo o Judeu que o coloca num plano inferior ao dos restantes condenados ao Inferno. O próprio Enforcado tem licença para embarcar. Até o Parvo troca o seu papel de comentador pelo de acusador e culpa o Judeu de profanar sepulturas cristãs e de comer carne em dia de jejum.
Evidentemente que o retrato da sociedade quinhentista ficaria incompleto se, no auto, não figurasse um judeu. Apesar de, na carta dirigida a D. João III e nalguns passos da sua obra, termos provas de que o nosso dramaturgo não concordava com a perseguição movida aos judeus e cristãos-novos, a verdade é que, como cristão-velho, dirige, na sua mesma obra, ásperas censuras ao judaísmo em geral.
Stephan Reckert informa-nos que o judeu não se aproxima da barca da Glória “quiçá por ter um crucifixo na vela, e na proa, verosimilmente, uma imagem de Nossa Senhora”. O estudo dos rostos das edições quinhentistas, seiscentistas e setecentistas, onde nos aparecem as barcas desenhadas, não autoriza tal suposição. Gil Vicente procura demonstrar, nesta cena, que o apego do Judeu à sua religião era tão forte que, nem mesmo depois de morto e com a verdade à vista, abandonava as suas ideias.
Mário Fiúza, in op. cit.
(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "A ALCOVITEIRA"



A ALCOVITEIRA (BRÍSIDA VAZ)

A ALCOVITEIRA (BRÍSIDA VAZ)
A Alcoviteira é um dos tipos mais interessantes do teatro vicentino. Estas mulheres dedicavam-se a fazer casamentos, a desencaminhar mulheres casadas e solteiras e a lançar rapariguitas na prostituição. Como esta profissão estava proibida por lei, para não caírem na alçada da justiça, fingiam que se dedicavam a bordar e a fabricar perfumes e cosméticos. O povo tachava-as de bruxas ou feiticeiras.
 É o tipo que nos aparece, neste auto, com mais elementos distintivos e caracterizadores. É um autêntico carregamento deles: além das moças que prostituía, transportava consigo seiscentos virgos postiços, jóias e vestidos roubados. Para poder montar o negócio no outro mundo, levava ainda uma casa movediça, um estrado de cortiça e dez coxins.
A linguagem que a Alcoviteira emprega, nomeadamente com o Anjo, funciona também como elemento distintivo. Trata-se de uma linguagem melíflua, lisonjeira, repleta de termos carinhosos, embora empregados hipocritamente. É de notar como a Alcoviteira tenta cativar o Anjo, chamando-lhe mano, meus olhos, minha rosa, meu amor, minhas boninas, olhos de perlinhas finas, etc. Seria certamente com esta lábia que ela conseguia atrair as jovens à chamada vida fácil.
A defesa arquitectada e posta em prática pela Alcoviteira revela mentira, hipocrisia, descaramento. Considera-se uma mártir por ter sido açoitada diversas vezes e compara a sua missão à dos apóstolos. Chega até a afirmar que converteu mais moças do que Santa Úrsula, que nenhuma delas se perdeu e que todas se salvaram. Trata-se de uma linguagem ambígua, em que os termos converter, salvar e perder-se, frequentes em textos religiosos, saem dos seus lábios com um significado chulo.
O tipo está bem caracterizado mas Gil Vicente critica a prostituição e os seus agentes muito superficialmente. Nem sequer alude às causas sócio-económicas que impeliam as moças a prostituírem-se. O nosso dramaturgo faz uma crítica a nível popular, explorando o pormenor faceto e foge ou é incapaz de estudar os problemas que equaciona com uma certa profundidade.
 Mário Fiúza, in op. cit.

(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Análise da cena "O FRADE"




O FRADE (FREI BABRIEL) E A MOÇA (FLORENÇA)  
O FRADE (FREI BABRIEL)
E A MOÇA (FLORENÇA)

Trata-se de um frade cortesão, dançarino, cantor e esgrimista que surge, no estrado, com a sua amante pela mão. O Diabo sentencia que ele irá para o Inferno por viver amancebado, desprezando assim os votos de castidade que formulara. Toda a defesa do Frade consiste em acreditar que o hábito que enverga o livrará das chamas infernais. Mas, repelido pelo Anjo, resigna-se e entra, juntamente com a sua amásia, na barca da  perdição. 
Mário Fiúza, in op. cit.
O CLERO NA ÉPOCA VICENTINA

O clero, classe numerosa, estava presente em todos os sectores da sociedade portuguesa, desde a corte até às mais escondidas aldeias das províncias. A maior parte dos seus membros acusava uma singular relaxação de costumes. Acontecia que muitos deles seguiam a carreira eclesiástica sem vocação, pela necessidade ou ela vontade dos pais. Era um meio de se livrarem das obrigações militares e de terem a vida assegurada, pois os conventos possuíam os seus bens materiais próprios. Daí a desconformidade entre os ideais e os actos, pois em vez de viverem uma vida de pobreza, de humildade de oração, buscam antes a riqueza e os prazeres da vida, são espadachins, blasfemam, têm mulher e filhos, ambicionam honras e cargos, bebem e até... se dedicam à astrologia. Muitos abandonam a clausura para viverem na corte, deixam crescer a tonsura; outros suspiram continuamente por bispados.
in Gigantes da Literatura Universal, Ed. Verbo
O tipo mais insistentemente observado e satirizado por Gil Vicente é sem dúvida o clérigo, e especialmenle o frade, presente em todos os sectores da sociedade portuguesa, na corte e no povo, na cidade e na aldeia. Gil Vicente censura nele a desconformidade entre os actos e os ideais, pois, em lugar de praticar a austeridade, a pobreza e a renúncia ao mundo, busca a riqueza e os prazeres, é espadachim, blasfema, tem mulher e prole, ambiciona honras e cargos, procedendo como se a ordenação sacerdotal o imunizasse contra os castigos que Deus tem reservados para os pecadores. A principal ambição dos clérigos vicentinos é bispar, ou seja, tornarem-se bispos ou prelados. Para o conseguir, um frade que participa na Romagem de Agravados defuma-se com palha amarela de modo a aparentar um rosto macilento de jejuns e mortificações. A sátira vicentina anticlerical, que atinge uma extraordinária violência, tem, além do seu fundo popular e tradicional, intenções bem definidas e às vezes alvos directos. Segundo Gil Vicente, os frades são indesejavelmente numerosos: “Somos mais frades que a terra”. Na Frágua do Amor, que simboliza a regeneração de Portugal a propósito do casamento do rei, um frade sem vocação entra na frágua e sai transformado em soldado; e mais sete mil frades aguardam o mesmo tratamento. Na Exortação da Guerra, Gil Vicente faz-se intérprete da pretensão do rei a cobrar o terço dos rendimentos dos bens eclesiásticos para a “guerra santa” em África. Desta forma se critica a multiplicação excessiva do clero e dos rendimentos eclesiásticos, que os monarcas queriam então desamortizar e adjudicar à coroa e à alta nobreza.
A. J. Saraiva e Óscar Lopes, in op. cit.
(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O SAPATEIRO"

O SAPATEIRO
O SAPATEIRO (JOÃO ANTÃO)
Quando o Sapateiro roga ao Anjo que o acolha na barca, este objecta-lhe: A cárrega t’embaraça[v. 347]. Mais adiante, esclarece um pouco mais o seu pensamento, quando, referindo-se às formas, adverte o Sapateiro: Se tu viveras dereito, / elas foram cá escusadas.” [vv. 358-359]. Para interpretar convenientemente estes dois passos, só vislumbramos uma solução: as formas tinham sido compradas com o dinheiro que o Sapateiro roubara aos seus fregueses e eram como que a materialização dos seus pecados. Se esta interpretação estiver certa, o dramaturgo não considera as formas só como um elemento distintivo e caracterizador de tipo, mas também como objectos que o Sapateiro fora obrigado a levar para o seu julgamento como provas de acusação.
Mestre Gil apresenta um sapateiro, carregado de formas, acusado pelo Diabo de roubar o povo. O Sapateiro não nega o facto e começa a citar, em sua defesa, o cumprimento de preceitos religiosos: faleceu confessado e comungado, ouviu missas, ofereceu donativos à Igreja e assistiu às horas de finados. É o Diabo quem o elucida que tudo isso nada abona em sua defesa, uma vez que roubava. Com toda esta cena, procurou o autor incutir no espectador esta doutrina: os preceitos devotos (ouvir missa, confessar-se, comungar, etc.) só ajudam os que levam uma vida verdadeiramente honesta. É, portanto, mais uma cena moralista de carácter religioso do que a condenação de um Sapateiro, acusado de roubar o povo. Aliás, em muitos outros passos, Mestre Gil defende este ponto de vista: ser-se religioso consiste mais em actuar com espírito evangélico do que assistir ou cumprir os actos externos do culto.
Mário Fiúza, in op. cit.
(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O PARVO"


O PARVO
O PARVO (JOANE)
Os parvos têm, no teatro vicentino, uma função cómica, ocasionada pelos disparates que proferem. Assim acontece neste auto, embora, em certos passos, o Parvo se junte às personagens sobrenaturais para criticar os que pretendem embarcar e sirva,  outras vezes, de comentador.
Evidentemente que, nos termos desarticulados e ilógicos, ditos pelos parvos, há, por vezes, muito que reflectir e analisar. Neste auto, isso acontece com os vv. 251 a 255, dissecados por Óscar Lopes e, sobretudo, com a célebre resposta ao Anjo: “... Samica alguém:” (ed. de 1518) ou Não sou ninguém” (ed. de 1562) que tem sido comentada por variadíssimos autores. (…)
A decisão do Anjo de acolher o Parvo, na sua barca, está na lógica da doutrina católica: não pode ser responsabilizado pelos seus actos quem nasceu irresponsável. É o que o Anjo exprime muito sinteticamente com a palavra simpreza [v. 302]. Simplesmente, o Anjo não lhe ordena que embarque imediatamente mas, pelo contrário, manda-o aguardar no cais os futuros companheiros (espera entanto per i, v. 304), transformando-o assim, no dizer de Stephen Reckert, no “representante alegórico da salvação adiada”. Mas, no momento próprio, os quatro Cavaleiros da Ordem de Cristo, seus companheiros, embarcam triunfalmente, deixando o Parvo no cais. A verdade é que quando chega a barca seguinte, já ele lá não estava...
Mário Fiúza, op. cit.
“O PARVO”
O mais óbvio recurso vicentino de nonsense é o Parvo, genealogicamente afim ao Sot medievo francês, originário da festa entrudesca das Crianças ou Inocentes que se insinuou no calendário litúrgico, e ainda ao Narr de festividades germânicas similares – mas adaptado a uma função mais específica.
O papel que desempenha no Auto da Barca do Inferno reconhece-se bem: exprime a candura dos pobres de espírito na sua agressividade instintiva e injuriosa contra o Diabo e os pecadores orgulhosos, e isso ressalta da bela réplica à pergunta de identificação que lhe é feita pelo Anjo: – Quem és tu?Não sou ninguém. Mas o que mais nos interessa agora fica para além da vitalidade agressiva dos insultos ou pulhas do Parvo, onde caoticamente se atropelam as imagens primárias e mais enérgicas da torpeza física ou moral; fica em coisas como a resposta ao convite de entrar na Barca Infernal: De pulo ou de voo? / Oh pesar de meu avô / Soma vim adoecer, / e fui má hora morrer, / e nela para mi só. Repare-se, por um lado, que o simples acto de embarcar pela prancha foi absurdamente posto fora de questão: o Parvo encara a hipótese de embarcar por meio de um voo como se isso fosse a coisa mais natural do mundo. Mas, sobretudo, repare-se nisto: ele fala na hora da sua própria morte com o espanto existencial de quem a sentiu na sua singularidade de morte para si só. É ou não verdade que atingimos desta feita o cândido e autêntico absurdo das coisas tais como são, e não são?(…)
Do Parvo puro e simples é muitas vezes difícil distinguir, funcionalmente, outros tipos vicentinos mais ou menos inocentes, como crianças, Pastores, Lavradores ou Vilãos. Entre o Parvo e o Menino, ambos perfeitamente irresponsáveis, a identidade funcional é quase completa: com excepção da linguagem desbragada que, no Auto da Barca do Inferno, dele faz um advogado de acusação paralelo ao Diabo mas nomeado pelo Céu, o Parvo deixa-se substituir pelo Menino como personificação da inocência no auto dos condenados ao Purgatório. 
Óscar Lopes, Ler e Depois – Crítica e Interpretação literária / 1, Ed. Inova, 1969

(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena "O ONZENEIRO"


O ONZENEIRO
Eis um cristão que conservava algo de comum com os judeus: a sua paixão pelo capital. Era um usurário que enriquecera à custa dos altos juros do dinheiro, que emprestara aos necessitados – um antepassado dos nossos modernos penhoristas, a quem o Diabo chama, com toda a propriedade, seu “parente” [v. 183].
Apresenta-se no estrado com um bolsão que ocupa quase toda a barca. O Onzeneiro informa-nos que vai vazio, certamente porque não pudera trazer com ele os vinte e seis milhões de cruzados que deixou bem escondidos no fundo de uma arca. Mas é só neles que ele pensa e chega a rogar ao Diabo que o deixe voltar ao mundo para ir buscá-los. Mas ali, no espaço para além da vida, apresenta-se tão pobre que nem sequer dispõe de uma moeda para pagar ao barqueiro.
Mário Fiúza, op. cit.

O símbolo do Onzeneiro é um bolsão onde guardava o dinheiro. Significa ele a ambição, a avareza. Apresentamos um poema de Bocage que, pelo seu conteúdo, se intertextualiza bem com esta cena, sobretudo, pelo seu carácter satírico:


Velho avarento

Levando um velho avarento
Uma pedrada num olho,
Pôs-se-lhe no mesmo instante
Tamanho como um repolho.

Certo doutor, não das dúzias,
Mas sim médico perfeito,
Dez moedas lhe pedia
Para o livrar do defeito.

“Dez moedas! (diz o avaro)
Meu sangue não desperdiço
Dez moedas por um olho
O outro dou eu por isso.”

(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

Análise da cena: "O FIDALGO"


O FIDALGO
O FIDALGO (D. ANRIQUE)
Gil Vicente apresenta o Fidalgo com toda a sua vaidade e presunção, “fumoso” [v. 99], ricamente vestido e seguido de um pajem que lhe soerguia a cauda do manto e lhe transportava uma cadeira de espaldas. Habituado a gozar de privilégios especiais, o Fidalgo nem sequer pensa que poderá ir para o Inferno. Assim, para justificar o seu direito a entrar na barca celestial, apresenta apenas ao Anjo, como único argumento, a sua condição social: Sou fidalgo de solar / é bem que me recolhais[vv. 80-81].
A sua altivez e jactância levam-no a exigir que todos o tratem por “Vossa Senhoria” de acordo com os seus pergaminhos nobiliárquicos. Por o Anjo lhe ter dito uma frase que ele considerou pouco cortês (Pera vossa fantesia / mui estreita é esta barca.”) [vv. 86-87], o Fidalgo reage logo violentamente: Pera senhor de tal marca / não há aqui mais cortesia?[vv. 88-89]. Mas o Diabo, momentos antes, tratara-o por tu nos vv. 45-49, sem qualquer reacção da parte do Fidalgo. Porquê? Certamente porque este ficou tão espantado com a revelação e acusação do Diabo que nem teve presença de espírito para o meter na ordem. Aliás é o próprio Diabo quem, passado este breve momento escarninho e zombeteiro, passa prontamente para o tratamento cerimonioso, depois de um verso de transição: Embarcai! Hou! Embarcai[v. 50]. Mas, na cena seguinte, depois de ter sido humilhado e condenado, vemos o Fidalgo tão abatido e deprimido que, quando o Onzeneiro o trata por vossa senhoria [v. 241], o Fidalgo já reage de modo inverso: Dá ò demo a cortesia!” [v. 242]. Mas, nessa altura, já não era um fidalgo mas um pobre condenado ao Inferno; o próprio Diabo ameaça espancá-lo: Dar-vos-ei tanta pancada / Com um remo, que reneguês![vv. 246-247].
Ao Fidalgo parece-lhe a barca infernal um “cortiço” [v. 31], isto é, uma barca muito ordinária e reles para transportar um nobre tão poderoso e importante como ele. Mas o Diabo e o Anjo formulam as suas críticas, que se podem resumir assim: que ele vivera a seu prazer [v. 47], isto é, que fizera tudo quanto quisera, que se entregara aos prazeres, fora tirano e, consequentemente, desprezara os pequenos [v. 103], ou seja, os elementos do povo. Para demonstrar que ele vivera a seu prazer, analisa Gil Vicente a vida sentimental do Fidalgo, repartida entre duas mulheres: a esposa e a amante. Mas o que o Fidalgo ignora e que o dramaturgo denuncia, para caracterizar melhor a sociedade do seu tempo, é que tanto uma como a outra lhe eram infiéis e tinha cada uma delas o seu amante. Não se trata, portanto, de um pormenor secundário mas de um elemento essencial para a caracterização do tipo e da sociedade em que estava inserido.
Mas Gil Vicente não condena só aquele aristocrata mas todos os seus antepassados, como afirma expressamente o Diabo quando informa o Fidalgo de que passará para o Inferno assim como passou vosso pai[v. 53], isto é, o autor generaliza e condena a nobreza como classe social.
O criado ou pajem que acompanha o Fidalgo não entra em nenhuma das barcas. Porquê? Evidentemente que não representa ali um tipo, uma alma de um defunto, mas um simples elemento caracterizador e distintivo, tratado a nível de objecto, que o dramaturgo risca do palco assim que deixa de ser necessário. Mas a sua função simbólica é deveras importante na medida em que representa um elemento do povo, a principal vítima da opressão da nobreza que, manifestamente, não poderia acompanhar o Fidalgo na sua viagem para o Inferno.
 Mário Fiúza, op. cit.
(extraído do manual escolar Com todas as letras - 9º ano, da Porto Editora)

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O teatro de Gil Vicente

O Auto da Barca do Inferno é uma complexa alegoria dramática de Gil Vicente, representada pela primeira vez em 1517. É a primeira parte da chamada trilogia das Barcas (sendo que a segunda e a terceira são respectivamente o Auto da Barca do Purgatório e o Auto da Barca da Glória).

              O Auto da Barca do Inferno,  uma obra para o 9º ano do Ensino Básico, apresenta personagens alegóricas, símbolos do Bem e do Mal, e uma galeria de personagens-tipo, representando cada uma delas a classe social  a que pertence e/ou a profissão que desempenha. Ao utilizar os vários tipos de cómico, Gil Vicente pretende criticar e satirizar os vícios da sociedade do seu tempo. O Auto da Barca do Inferno é uma obra representativa da dramaturgia vicentina.
Para saberes mais sobre a peça de teatro: http://pt.wikipedia.org/wiki/Auto_da_Barca_do_Inferno

Sobre a época, a vida e a obra de Gil Vicente:

EXERCÍCIOS INTERACTIVOS
  • Resolve o exercício  sobre o argumento d' O Auto da Barca do Inferno aqui .
  • Resolve o exercício relativo à cena  d' "O Fidalgo" aqui .